A Igreja

Introdução

Recentemente, tive um debate com meu pai sobre a Igreja. Foi uma conversa difícil, marcada mais por desgaste do que por frutos. Ele, influenciado pelo relativismo religioso tão presente em nosso tempo, não consegue enxergar a Igreja como realidade divina, mas apenas como uma instituição humana entre tantas outras. Tenho enfrentado alguns desafetos com meus pais quando o assunto é Deus e Sua Igreja. Ambos manifestam suas crenças conforme sentimentos e percepções individuais sobre a realidade, sem de fato levar em consideração com seriedade a Autoridade da Palavra, permitindo que o relativismo religioso com toda sua hipocrisia e falta de ordem conduza suas vidas. Enquanto minha mãe segue a doutrina espírita, dentre outras práticas e crenças – algumas católicas misturadas, meu pai me parece muito mais uma pessoa agnóstica que desenvolveu a própria ideia de Deus ajustada dentro de seus parâmetros e conceito de justiça.

Todos os dias permito-me ser convertido pela Palavra e pelo Espírito Santo, sabendo que já fui um convicto ateu, pensei que seria muito mais fácil desenvolver estes aprendizados junto deles, que já tinham alguma maturidade espiritual. Sendo meu pai uma pessoa extremamente orgulhosa e com Temperamento Colérico, decidi me aproximar primeiro de minha mãe para contar o que eu estava aprendendo e com isto tentar ajudar a organizar e convergir suas crenças para uma sólida linha de coerência teológica e espiritual. Pensei que através dela, poderíamos juntos alcançar meu pai, minhas irmãs, demais parentes e amigos. Mas tenho falhado miseravelmente neste “projeto”. O mau que habita este mundo é astuto e ele consegue interromper os debates, principalmente porque a pessoa que se tenta informar sobre a unicidade da Fé e a Verdade Cristã, encontrando-se despidas da Verdade, são convidadas a confrontar suas crenças com o Novo apresentado, e sentindo-se ameaçadas interpretam o debate como agressões pessoais. Para evitar desgastes com minha mãe, interrompi o debate.

Tenho me questionado, será que sou eu quem estou me afastando de meus pais ou seriam eles os que escolheram se afastar da Igreja de Deus? Rezo todos os dias para que Nosso Senhor me forneça através de Sua graça, a sabedoria necessária para entender esta realidade com todo o amor requerido, pois dado estes longos 18 anos sem Deus, decidi-me não privar nem a mim nem a minha família, sequer um segundo de seguir Tua Palavra e o Espírito.

Com meu pai foi mais recente. Talvez por conta da desordem espiritual presente, ru realmente não consigo determinar os caminhos que percorrem seus pensamentos, o que me entristece bastante constatar o tanto que ele odeia e despreza a Igreja. Ele tem uma aversão tão grande que eu não consigo mensurar, cegando-o para os Sacramentos. Ano passado me casei em uma cerimônia ecumênica pois ainda me encontrava como um completo descrente de tudo, que não entendia nada de nada. Este ano, pouco mais de 1 ano após esta celebração e muitos meses de vivência em Cristo, eu e minha esposa Crismamos e também resolvemos fazer a cerimônia na Igreja como se deve, desta vez honrando e recebendo a Benção Sacramental do principal convidado, Nosso Senhor Jesus Cristo. Meu pai não foi nesta cerimônia. Ele não está presente nas fotos e ainda fez e faz piada quando pode a respeito de “casar 2x” com a mesma pessoa. Pessoalmente não me sinto ofendido, mas me entristeço pelo estado espiritual infantil que se manifesta através de um convicto orgulho, tão confuso e perdido. Uma pessoa convicta da própria ignorância espiritual.

“A semente que caiu em terra boa são os que, ouvindo a Palavra com coração reto e bom, a conservam e dão fruto pela perseverança.” (Lucas 8,15)

Aqui também peço a Deus que me livre do ímpeto julgador, muito pelo contrário, que eu tenha a sabedoria de separar o que é orgulho do que é fato, pois constatar uma realidade é um ato de dever e coragem:

“Prega a palavra, insiste oportuna e inoportunamente, repreende, censura, exorta com toda paciência e doutrina” (2Tm 4,2)

O Evangelho de hoje (Domingo, 26 de Outubro de 2025) foi providencial, pois assumo sem vergonha alguma que sou novato e que muito me falta para caminhar na satisfação que Nosso Senhor tem sonhado para mim e minha família:

“Dois homens subiram ao Templo para rezar: um era fariseu, o outro cobrador de impostos.
O fariseu, de pé, rezava assim em seu íntimo:
‘Ó Deus, eu te agradeço porque não sou como os outros homens, ladrões, injustos, adúlteros, nem como este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de toda a minha renda’.
O cobrador de impostos, porém, ficou à distância e nem se atrevia a levantar os olhos para o céu; mas batia no peito, dizendo:
‘Meu Deus, tem piedade de mim, que sou pecador!’
Eu vos digo: este último voltou para casa justificado, e não o outro.
Pois quem se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado.”
(Lucas 18,9-14)

Aqui Jesus denuncia a soberba espiritual, quem confia apenas nas próprias obras e despreza os outros não conduz à justificação para o Pai. A humildade abre o coração à graça: o publicano, reconhecendo-se pecador, encontra misericórdia diante de Deus. A lição para a Igreja é que a oração verdadeira nasce da humildade e da confiança no amor de Deus, não da comparação com os outros.

Portanto também me questiono se por acaso minhas atitudes são demonstrações gratuitas de uma soberba velada ou se de fato minha atuação tem visado corrigir a percepção caluniadora da realidade relativa que meus pais optaram por seguir. Esta tem sido uma grande luta interna de entendimento e portando peço ajuda a Deus todos os dias que me ajude neste discernimento e que inspire minhas ações conforme Sua vontade.

Essa experiência me fez perceber o quanto ainda é necessário esclarecer: afinal, o que é — e quem é — a Igreja de Cristo?

O Que a Igreja Não É

A Igreja não é apenas um prédio bonito, nem uma associação de pessoas que compartilham valores semelhantes. Não é apenas um espaço físico para oração, também não é uma invenção humana para controlar consciências ou manter tradições culturais. Reduzir a Igreja a isso é perder de vista sua verdadeira essência.

Um dos meus argumentos com meu pai e também uma firme constatação sobre ele próprio, foi afirmar que o conhecimento que dele demonstrou sobre a Igreja era nulo, ou seja, que ele não sabia absolutamente nada do que estava falando. Para contextualizar, iniciamos a conversa comigo enviando um excelente vídeo do professor Bernardo Küster desmistificando completamente a lenda de que ditadores e políticos associados à ideologia política do Comunismo mantinham contas secretas no Vaticano. Interessante que no vídeo, o professor Küster nos alerta sobre o péssimo hábito de se escorar no atalho mental do viés de confirmação, distorcendo a realidade ao selecionar dados que reforcem pré-conceitos e crenças ao mesmo tempo que rejeita ou minimiza informações que podem contradizê-las. Foi exatamente o formato de resposta que obtive do meu pai.

Mesmo que meu pai tenha recusado meu convite que se seguiu na sequência, repito aqui o mesmo incentivo para que a Igreja seja conhecida da mesma forma que ela foi criada, de dentro para fora. Isto significa que a Fé, a Palavra, a Tradição e a Hierarquia devem ser compreendidas e vividas para que haja adequado aprendizado, transformação e compreensão verdadeiros.

“Perseveravam na doutrina dos apóstolos, na comunhão, na fração do pão e nas orações… E o Senhor acrescentava cada dia à comunidade aqueles que iam sendo salvos.” (Atos 2,42-47)

O Fundamento Bíblico

A Igreja não nasceu de uma iniciativa humana, mas da vontade expressa de Cristo. Portanto ela é o Corpo Místico de Cristo (Catecismo §§ 787-796), é o Povo de Deus em peregrinação e animado pelo Espírito Santo, chamado a ser sinal visível da Salvação no mundo.

Ele mesmo a fundou sobre Pedro e a confirmou solenemente no dia de Pentecostes:

  • A fundação sobre Pedro, quando Simão confessa:

“Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16,16)

Jesus lhe dá um novo nome e uma missão única:

“Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus…” (Mt 16,18-19)

Aqui, Cristo estabelece Pedro como fundamento da unidade da Igreja. O novo nome — Pedro, “rocha” — indica que a comunidade dos fiéis não se sustentará em ideias humanas, mas na autoridade dada por Cristo a seu apóstolo.

  • Pentecostes: O nascimento visível da Igreja, após a Ressurreição, Jesus ordenou aos discípulos que permanecessem em Jerusalém até receberem o Espírito Santo (At 1,4-5), e prometeu:

“Recebereis o poder do Espírito Santo, que virá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra” (At 1,8)

No dia de Pentecostes (At 2,1-13), o Espírito Santo desceu sobre os apóstolos em forma de línguas de fogo. Eles, antes temerosos, foram transformados em testemunhas corajosas, anunciando a Boa-Nova em diversas línguas. Ali a Igreja se manifestou publicamente ao mundo, cumprindo a ordem de Cristo:

“Ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a observar tudo o que vos ordenei” (Mt 28,19-20)

Assim, a Igreja nasce: Fundada sobre Pedro, confirmada pelo Espírito Santo e enviada em missão universal.

Ela é a união de duas realidades, ao mesmo tempo:

  1. Visível, com sua hierarquia, Sacramentos e comunidade concreta;
  2. Espiritual, unida a Cristo e sustentada pela graça.

Essas duas realidades não se separam: A Igreja é humana e divina, terrena e celeste, histórica e eterna.

São Paulo nos recorda que Cristo amou a Igreja e se entregou por ela (Ef 5,25), e que nós somos membros de um só Corpo, cujo Cabeça é Cristo (1Cor 12).

De Dentro para Fora

Racionalizando de dentro para fora como sugeri, a compreensão primordial e mais óbvia começa ao constatar que Cristo em pessoa está presente na Eucaristia, acessível a todos os fiéis através da Sagrada Missa, uma dupla-realidade, visível e espiritual manifestadas pelo milagre divino da Consagração instituída pela autoridade de Cristo. Da mesma forma, o Batismo e a Crisma que nos redimem da herança pecaminosa de Adão e Eva, unidos à Confissão que nos permite manter o estado de graça suficientemente limpo e adequado para receber Cristo, pela Eucaristia. É assim que todos nos tornamos parte do Corpo Místico de Cristo e ganhamos por herança através da graça, o direito de chamar Deus, também de Pai — E por isto somos salvos.

“Todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Pois não recebestes um espírito de escravidão para recair no temor, mas recebestes o Espírito de adoção, no qual clamamos: ‘Abbá, Pai!’ O próprio Espírito dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. E, se somos filhos, somos também herdeiros: herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo…” (Romanos 8,14-17)

O Sacerdócio tem seu fundamento teológico na própria instituição de Cristo, que na Última Ceia confiou aos apóstolos o mandamento:

“Fazei isto em memória de mim” (Lc 22,19)

Tornando-os participantes de seu único sacerdócio eterno. A Santa Sé ensina que o padre é configurado a Cristo Cabeça e Pastor, chamado a servir ao povo de Deus como ministro da Palavra, da Eucaristia e da reconciliação, sendo presença sacramental de Cristo no meio da Igreja. São Padre Pio, com sua espiritualidade marcada pela centralidade da Missa, via os sacerdotes como “administradores do Sangue de Cristo”, pois é pelas mãos deles que o sacrifício redentor se torna presente no altar e chega ao coração dos fiéis. Além disso, o sacerdote é o administrador dos Sacramentos, canais da graça instituídos por Cristo, e recebeu desde Pentecostes — pela sucessão apostólica — a autoridade transmitida de geração em geração para perdoar os pecados em nome do Senhor, conforme o mandato do Ressuscitado:

“A quem perdoardes os pecados, serão perdoados” (Jo 20,23)

Assim, no sacramento da Confissão, o padre age in persona Christi, aplicando os méritos do sacrifício da Cruz e reconciliando o pecador com Deus e com a Igreja.

A Caridade é o coração do Evangelho e seguro caminho para o Céu, como ensina São Paulo:

“Ainda que eu tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tivesse caridade, nada seria” (1Cor 13,2)

E o próprio Cristo declara no juízo final:

“Tive fome e me destes de comer… todas as vezes que fizestes isso a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,35.40)

Por isso, a Igreja, fiel a esse mandato, tornou-se a maior força humanitária do mundo, administrando mais de 115 mil instituições de caridade espalhadas pelos cinco continentes, entre hospitais, escolas, orfanatos, casas de acolhida e centros de assistência social e pastorais, servindo não apenas aos católicos, mas a todos os necessitados, como expressão concreta do amor de Cristo que se faz presente através das obras de misericórdia.

Sem falar dos Milagres, das centenas de milhões de conversões por todo o mundo por meio da graça divina, desde a primeira vinda de Nosso Senhor e presente até os dias de hoje. São sinais extraordinários da ação de Deus que confirmam a missão de Cristo e da Igreja, não como espetáculos, mas como expressões da misericórdia divina que conduzem à fé e à conversão. O Catecismo da Igreja Católica (nn. 547-550) ensina que os milagres de Jesus anunciam a chegada do Reino de Deus e confirmam sua identidade como Messias e Filho de Deus.

Por isso, a Igreja os reconhece como testemunhos da presença viva de Cristo, que fortalecem a esperança dos fiéis e apontam para a vitória definitiva sobre o mal e a morte. Além disso, a Santa Sé exige a comprovação de milagres em processos de canonização, entendendo-os como selo divino que autêntica a santidade de vida. Assim, os milagres têm importância fundamental: Revelam o amor de Deus pelos pobres e sofredores, confirmam a verdade do Evangelho e recordam que a fé cristã não é apenas doutrina, mas experiência concreta da ação salvífica de Deus na história.

O Desafio do Relativismo

Vivemos tempos em que muitos dizem: “todas as religiões são iguais”. Mas se todas as religiões fossem iguais, Cristo não teria instituído a sua Igreja, nem teria confiado a ela a missão de anunciar a verdade e administrar os Sacramentos. A Igreja não é apenas “mais uma religião”, mas a continuação da missão de Cristo no mundo, sacramento universal da salvação.

Eu já fiz uma longa dissertação sobre o Relativismo aqui neste post, por isto reforço que por óbvio, Cristo não seria irresponsável ao ponto de deixar instruções para um desordenamento religioso onde dezenas de milhares de vertentes Cristãs fossem seguidas pelo mundo afora, cada qual na sua intimidade doutrinal e ritualística. Um apelo simples para a lógica básica nos força a pensar como Cristo, que é Deus e perfeito, jamais tomaria decisões que comprometessem sua própria Revelação, portanto animem-se para a Verdade em Sua Igreja.

Ser Igreja não é apenas “ir à missa” ou “seguir regras”. É viver como membro do Corpo de Cristo, unido a Ele e aos irmãos, caminhando rumo à Santidade. A Igreja é a Esposa amada do Cordeiro, chamada a preparar-se para as núpcias Eternas.

Um Convite para Reflexão

Diante de tudo isso, fica claro que a Igreja não é uma invenção humana, mas a obra viva de Cristo que continua a agir na história. Ela é o Corpo Místico do Senhor, sustentada pelo Espírito Santo, e lugar onde encontramos os Sacramentos que nos unem a Deus e nos conduzem à vida eterna.

Reconhecer essa realidade exige de cada um de nós uma escolha: Permanecer na indiferença ou abrir o coração para a graça. O próprio Cristo nos recorda:

“Quem vos ouve, a mim ouve; quem vos rejeita, a mim rejeita” (Lucas 10,16)

Rejeitar a Igreja é, portanto, rejeitar o próprio Cristo que a fundou e a sustenta. Este é um convite para que você, leitor, olhe para dentro de si e se pergunte:

  • Tenho vivido a fé como parte do Corpo de Cristo ou apenas como uma ideia abstrata?
  • Tenho buscado os Sacramentos como fonte de vida ou me deixado levar pelo relativismo que enfraquece a Verdade?

A Igreja é santa porque é de Cristo, mas é também feita de homens e mulheres em caminho, chamados à Conversão Diária. Por isso, não espere perfeição humana para reconhecer a perfeição divina que nela habita. Que este seja o momento de redescobrir a beleza da Igreja como casa e família espiritual, onde Cristo está realmente presente na Eucaristia, onde o perdão é oferecido no sacramento da Reconciliação, onde a caridade se torna concreta em milhares de obras espalhadas pelo mundo, e onde os milagres continuam a confirmar a ação de Deus.

Acolher a Igreja é acolher o próprio Cristo. E, como filhos adotivos do Pai, herdeiros da promessa, somos chamados a viver não apenas como espectadores, mas como membros vivos desse Corpo que caminha rumo à eternidade.